25 JUN 2025
A decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) de suspender a construção do Hospital Metropolitano de Natal, por suspeitas de fraude e favorecimento na licitação vencida por um consórcio de três empreiteiras potiguares, no valor de R$ 200,7 milhões, reacende um trauma ainda vivo na memória da população do Rio Grande do Norte. Há o temor de que Natal seja mais uma vez penalizada com a perda de uma estrutura hospitalar fundamental, justamente em um cenário de colapso e deficiências históricas na rede pública de saúde.
A lembrança inevitável é a do fracassado projeto do Hospital Terciário de Natal, tema de uma extensa e impactante reportagem da Revista BZZZ publicada em abril de 2014, sob o título “Dinheiro público jogado aos porcos”. Segundo o levantamento da revista, o hospital começou a ser erguido no início dos anos 1990, com previsão de 150 leitos para atender pacientes oncológicos da capital e da Região Metropolitana. Após consumir cerca de R$ 25 milhões dos cofres públicos, as obras foram paralisadas em 1991, sob alegações de superfaturamento detectado pelo próprio TCU.
Com o passar dos anos, o esqueleto da obra se transformou em um símbolo do abandono e da omissão do poder público. A matéria da BZZZ descreve o cenário de devastação no terreno às margens da Avenida Capitão-Mor Gouveia: estruturas vandalizadas, material saqueado, presença constante de usuários de drogas, crianças armadas, lixo espalhado, animais criados em meio aos escombros e um ambiente de alto risco à saúde pública. Um criador de porcos chegou a relatar que aproveitou a estrutura abandonada “para dar alguma utilidade”, criando cerca de 20 animais no espaço onde deveriam estar pacientes sendo tratados.
O processo que poderia responsabilizar os gestores foi arquivado pelo TCU em 2011, após anos de investigações inconclusivas e troca de administrações estaduais. Segundo a reportagem, o próprio tribunal admitiu a “impossibilidade de responsabilizar” um único agente, atribuindo o dano ao Estado do Rio Grande do Norte como um todo. O Ministério Público Federal também encerrou o procedimento, restando apenas uma apuração preliminar iniciada pelo Ministério Público de Contas.
A suspensão da nova obra do Hospital Metropolitano, em meio a suspeitas semelhantes de irregularidades, levanta a angústia de que o mesmo ciclo de desperdício, abandono e sofrimento da população volte a se repetir. A reportagem da Revista BZZZ, que documentou o desfecho trágico do Hospital Terciário, serve como alerta. Natal não pode mais uma vez pagar a conta da morosidade, da ineficiência ou de possíveis favorecimentos. A cidade, e especialmente os mais pobres, não suportam outro hospital prometido que acabe virando escombro – ou chiqueiro.
Autor(a): Eliana Lima