Saúde

Pesquisadores usam inteligência artificial para prever casos de dengue, que só este ano já são mais de 400 mil casos no Brasil

21 ABR 2022

Foto: Alessandre Medeiros - Facebook

Cerca de 400 mil casos suspeitos de dengue foram registrados no Brasil, somente nos quatro primeiros meses de 2022. Os números, disponíveis no último boletim epidemiológico do Ministério da Saúde, revelam um aumento de 85,6% nas infecções por esse vírus, transmitido pela picada do mosquito Aedes aegypti, em relação ao mesmo período de 2021. 


Por ser um problema antigo de saúde pública no Brasil – a dengue, e outras arboviroses, a questão chamou a atenção de pesquisadores brasileiros que buscam soluções viáveis para combater o mosquito transmissor. 


O grupo de cientistas desenvolveu um método baseado em inteligência artificial que analisou diversas fontes de dados. Os casos e as internações de pacientes que adoeceram com dengue no município de Natal, capital do Rio Grande do Norte, são exemplos destas fontes.


Entre as informações coletadas estão os dados referentes a internações hospitalares e o número de  casos confirmados. Porém, a maior inovação do método empregado pelos cientistas, além da inteligência artificial, foram os ovos dos mosquitos. 


Para realizar o estudo, foram espalhadas armadilhas para coletar ovos, conhecidas como ovitrampa (que simulam um ambiente perfeito para a procriação do Aedes aegypti), nas quatro regiões de Natal, a cada 300m², formando uma malha de captura de mosquitos e ovos. 


“Essa técnica, conhecida como ovitrampa, foi implantada em Natal pelo então diretor do Centro de Zoonoses de Natal, Alessandre Medeiros (in memorian). O Centro de Zoonoses de Natal é vinculado ao Departamento de Vigilância em Saúde (DVS) da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de Natal”, explica Ricardo Valentim, diretor do Laboratório de Inovação Tecnológica em Saúde (LAIS/UFRN) e um dos pesquisadores envolvidos na pesquisa. 


Validação científica pela Nature


Todo o trabalho realizado pelos pesquisadores foi agora validado cientificamente, por meio da publicação do artigo “Data-driven computational intelligence applied to dengue outbreak forecasting: a case study at the scale of the city of Natal, RN-Brazil”. 


O trabalho foi publicado no Scientific Report, periódico do grupo Nature, um dos principais repositórios científicos do mundo. Com o título em português Inteligência computacional orientada a dados aplicada à previsão de surtos de dengue: um estudo de caso na escala da cidade de Natal, RN-Brasil, o trabalho é de autoria dos pesquisadores Ignacio Sanchez-Gendriz, Gustavo Fontoura de Souza, Ion Garcia Mascarehas de Andrade, Adrião Duarte Doria Neto, Alexandre de Medeiros Tavares, Daniele Montenegro da Silva Barros, Antonio Higor Freire de Morais, Leonardo Judson Galvão-Lima e Ricardo Alexsandro de Medeiros Valentim.


O artigo apresenta os resultados obtidos pelos pesquisadores que desenvolveram um algoritmo usando a técnicas de inteligências artificiais, como por exemplo, machine learning (aprendizagem de máquina) que ensina os computadores a aprenderem determinados padrões. 


Foram utilizados um grande volume de dados acumulados em fontes distintas em um período de quatros anos. “A publicação é importante, pois chancela a qualidade da pesquisa feita, o que garante o rigor científico e a revisão por pares, aspecto importante para ciência global, além de divulgar internacionalmente um importante resultado científico de cientistas potiguares”, reforça Ricardo Valentim.


Ainda de acordo com o diretor do LAIS, a grande inovação deste método computacional foi a utilização de ovos dos mosquitos. Com isso, o algoritmo consegue prever com seis semanas de antecedência um iminente surto de dengue no município de Natal, antes mesmo dos primeiros casos ocorrerem. “A precisão de acerto do algoritmo é superior a 90%”, completou.


“Esse achado científico representa um marco importante, pois agora a autoridade de saúde pública do municipal Natal poderá aplicar métodos mais efetivos de prevenção aos surtos de dengue na cidade, e com isso poderá evitar adoecimentos, hospitais lotados e mortes. Essa era a expectativa do Alessandre quando estava na direção do Centro de Zoonoses de Natal, Alessandre Medeiros: validar cientificamente o método que ele ajudou a criar na capital potiguar.” 


Expansão


Segundo os pesquisadores, o método pode ser replicado para outros lugares do Brasil e também para outros países tropicais que vivem surtos e/ou epidemias de dengue, concretizando-se como uma contribuição científica relevante para a saúde global, possibilitando a melhora da resposta dos sistemas de saúde, além de tornar os sistemas mais sustentáveis, resilientes e responsivos para as questões relacionadas à problemática da dengue, doença que nos últimos anos se espalhou rapidamente por todas as regiões das Américas. 


O vírus da dengue é transmitido por mosquitos fêmea, principalmente da espécie Aedes aegypti e, em menor proporção, da espécie Aedes albopictus. 


Esses mosquitos também transmitem outras doenças, como a chikungunya e a zika. A dengue ocorre de forma generalizada ao longo dos trópicos, com variações locais de risco influenciadas pela precipitação, temperatura e rápida urbanização não planejada. 


Em algumas regiões do Brasil, a situação da infecção é mais grave. No Centro-Oeste, o crescimento em comparação com o ano passado foi de 242%. Até o momento, a região registrou 648 casos por 100 mil habitantes — em segundo lugar aparece o Sul, com 198 casos por 100 mil. Entre as cinco cidades mais atingidas, três estão no Centro-Oeste: Goiânia (25,1 mil casos), Brasília (19,2 mil) e Aparecida de Goiânia (4,6 mil). Completam a lista Palmas (7,5 mil), no Tocantins, e Votuporanga (4,7 mil), em São Paulo. Os dados são da BBC News Brasil.


Cientista receberá homenagem póstuma


O grupo de cientistas potiguares,  autores do artigo,  fará uma homenagem ao colega de pesquisa pela sua importante contribuição científica para o país, será entregue aos familiares e ao Centro Zoonoses de Natal o Mérito Nacional de Inovação em Saúde no Enfrentamento às Arboviroses para o senhor Alessandre Medeiros, que morreu no ano de 2021, quando a pesquisa ainda estava em andamento. O sonho dele era ver seu trabalho publicado em uma revista científica de impacto internacional, o que infelizmente só se concretizou depois de sua morte. 

Link para o artigo 
aqui.


Do BZN


Alessandre Medeiros morreu em maio de 2021, aos 49 anos, vítima de parada cardiorespiratória. Estava em tratamento contra um câncer de intestino.

Fonte: Valéria Credídio - Lais-UFRN



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